MUITO CUIDADO COM O SEU HEDOPENSAMENTO

Por Carlos Correia Santos - Educador e Terapeuta

Um fato: a imensa pressão psicológica universal trazida pela pandemia do coronavírus, em 2020, acentuou a busca agônica pelo que chamo de hedopensamento. O termo hedo é o componente semântico da palavra hedonismo que, numa explicação rápida e rasa, significa a necessidade de sentir prazer constantemente. O hedonista dedica sua órbita de vida a experiências, vivências, manifestações e reações que apenas sejam calcadas na satisfação. O hedopensamento é, portanto, em primeira instância, um pensamento hedonista. É o pensamento que precisa ser prazeroso o tempo inteiro.

E é isso que tenho visto se agigantar. Uma porta de angustia se abre? Vamos pensar de forma jubilosa. O problema é o efeito cascata preocupante que causam pensamentos cheios de adornos. A vacina está demorando a chegar? Ah, mas a doença já não está mais tão grave assim.  Se a doença já não está tão grave assim, pra que ficar o tempo todo dentro de casa? Se não tem sentido ficar o tempo todo dentro de casa e a doença não está tão grave assim, pra que usar máscara na rua? Se não precisamos mais nos proteger tanto, por que não dar uma saidinha rápida com aquele contatinho que anda dando em cima de mim? Nisso... vamos criando, dentro desse exemplo, condições muitas para a Covid 19 fazer a festa em nossos organismos. E notem: os comportamentos nocivos iniciaram graças a um simples hedopensamento que parecia tão inocente: ah, mas a doença já não está mais tão grave assim...

Dr. Aaron Beck, por meio de sua teoria cognitivo comportamental, muito sabiamente, nos alerta sobre as armadilhas que são os chamados pensamentos automáticos. E o que são esses? Vamos a mais uma explicação bem rudimentar: são os pensamentos que nos tomam de assalto - resultantes de esquemas emocionais internos nossos - e que nos levam a comportamentos desalinhados. Beck nos aconselha a nos dedicarmos  ao exercício de olhar para esses nossos pensamentos automáticos, não para os comportamentos deles resultantes. Invariavelmente, fazemos o contrário: notamos nossos comportamentos indesejados e ficamos presos a peleja de tentar ajustar esses comportamentos. Enquanto não controlamos os pensamentos automáticos, seguimos erráticos. O hedopensamento é, numa instância seguinte, um tipo de pensamento automático. E, desta feita, uma esteira rolante no rumo certeiro do negacionismo.

Opa! Calma. Não estou lhe recomendando passar a só pensar de forma sombria. Não. Não é isso. A senha é não ter medo do que é problemático. E, assim, encarar de frente os fatos. Pare de romantizar o que não é lírico. Pare de dourar as pílulas. Pare de fugir do que não é prazeroso à psique. Encarar que coisas são duras, difíceis, complicadas, angustiantes, aflitivas é o primeiro passo que se dá na longa estrada que pode tornar as coisas todas menos duras, difíceis, complicadas, angustiantes, aflitivas.

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Carlos Correia Santos é Psicopedagogo e Musicoterapeuta, especialista em Educação Inclusiva, especialista em Autismo, especialista em Saúde Mental, especialista em Educação Musical e Ensino de Artes, Psicanalista em formação, pós-graduando em TGD - Transtornos Globais do Desenvolvimento e pós-graduando em Neuropsicologia.

 


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