A FALTA QUE A PSICOÍNDOLE MUSICAL FAZ A ORQUESTRA SOCIAL
Por Carlos Correia Santos - Educador e Terapeuta
Psicoíndole artística. O que é isso? Confesso sem o menor pudor: um termo totalmente cunhado por mim. E o explico de bom grado. Tenho experiências artísticas em terrenos diversos. Estudo violino desde rapaz. Comecei a escrever poemas e contos aos 11 anos. Tornei-me dramaturgo. Canto. Atuo. Já ganhei prêmio em salão de artes plásticas. Todo esse corredor vivencial na Arte me fez perceber que, de um modo geral, os colegas artistas de cada segmento costumam ter modus operandi emocional e relacional bem claros. Claro que nada é regra e tudo é arbitrária impressão minha. Mas partilho como vejo o assunto.
A forma como produzimos nosso trabalho e o entregamos ao outro fala bastante sobre nossa índole, sobre nossa psique.
O escritor é por demais si mesmo. Cuida do seu fazer sozinho e o entrega para o insondável. Quem vai ler aquela produção literária? Onde e como sua obra vai ser fruída? Impossível inferir. O poeta, o contista, o cronista, o romancista criam na solidão. O escritor, portanto, tende a ter uma psicoíndole solitária, introvertida, autorresolutiva por natureza. Porta-se como um constante ser sozinho. Que faz, entrega e se aparta. Não à toa, associações de escritores são quase sempre problemáticas. Como encontrar linhas coletivas para quem sempre sublinha o individual?
O ator, por sua vez, é um bicho do grupo. Mas, paradoxalmente, é desde cedo educado a entender que deve ser o centro do fazer teatral. Cada ator, per si, aprende que é o centro da cena. Todos os seus mestres lhe ensinam isso. Que riscos imensos à vaidade, não? Ele está entre muitos, mas se move e se lança sempre em prol do seu particular luzir. Uma hora descobre que, mesmo em meio a uma engrenagem na qual sua fala depende da que seu colega vai lhe deixar, é possível fazer o que se chama "roubar a cena". O ator pode e sempre quer se destacar, puxar pra si o foco da luz. E ainda que roube a cena dos demais, vejam que incrível, ganha os aplausos efusivos da plateia. É recompensado! Embora excessivamente extrovertida, a psicoíndole do ator tende a ser perigosamente ególatra. Penso mesmo que, caso queira gozar de qualitativa saúde mental, cabe ao artista teatral o trabalho constante de domar em si a sedução de ser indomável.
O musicista é também uma criatura do grupo. Mas desde a sua primeiríssima aula (amadora ou profissional) aprende que precisa depender do outro. Seu instrumento só estará afinado se na mesma frequência sonora do outro. A grande meta do seu fazer é unissonar. Ou seja, o som do seu tocar, para estar bem tocado, precisa estar pareado ao de seus colegas. E, ao contrário do ator, se decide suplantar os demais, se decide brilhar acima dos outros tons... destrói a boa execução musical. A psicoíndole do musicista tende a ser paritária por necessidade e obrigação.
Todos esses possíveis naipes de supostas índoles e psiques artísticas levam-me a uma mais profunda conjectura...
Nesses tempos de agir comunitário tão desarmonizado... fácil pensar o quanto a psicoíndole musical anda fazendo falta. O ser humano tem se dedicado mais e mais à prática da escritura exclusiva dos seus interesses solitários, à encenação única de suas convicções particulares. A orquestra social anda bastante desarmonizada. A banda tem tocado de maneiras imensamente estranhas no viver humano.
Pare... E se reafine! Você escritor... tenha um pouco do musicar na alma... Você ator... tenha um pouco de suave melodia no proceder. Mesmo você, músico, não se perca de ser o que a Música pede... E também você que não escreve, não atua, nem toca... sim... Você!... Acorde... Seja compasso que se alonga até o próximo... Faça-se bemol e pense em tudo aquilo que vem antes de você... Toque-se e seja sinfônico!
ACESSE ESSE TEXTO NO PODCAST DE CARLOS CORREIA SANTOS:
https://anchor.fm/carlos-correia-santos/episodes/A-FALTA-QUE-A-PSICONDOLE-MUSICAL-FAZ-A-ORQUESTRA-SOCIAL-ehc6jq/a-a2qfgml
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Carlos Correia Santos é Psicopedagogo e Musicoterapeuta, especialista em
Educação Inclusiva, especialista em Autismo, especialista em Saúde Mental,
especialista em EDucação Musical e Ensino de Artes, Psicanalista em formação,
pós-graduando em TGD - Transtornos Globais do Desenvolvimento.
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